Ou o Brasil acaba com a saúva, ou a saúva acaba com o Brasil
Auguste de Saint-Hilaire (1779-1853)
Apesar da frase acima ter sido considerada uma previsão profética, hoje a mesma se afasta muito da realidade posto a evolução no trato das culturas com e sem agrotóxicos. Mesmo assim o ataque de formigas cortadeiras é um dos principais problemas da agricultura.
Um ataque de cortadeiras pode desfolhar uma árvore frondosa em poucas horas. As folhas são transportadas às inúmeras galerias do formigueiro onde são picadas e dadas de alimento a cultura de fungos, alimento da colônia e lavas em criação. As cortadeiras normalmente se alimentam diretamente da seiva das folhas que estão cortando.
Na olivicultura, são as mudas e oliveiras novas que mais sofrem, podendo não resistir a ataques repetitivos.
Mesmo com todo estrago, as formigas fazem parte do ecossistema e cadeia antrópica da natureza. Apesar de serem consideradas como “praga”, não podemos ter a pretensão de exinguí-las.
Formiga – Cortadeiras
As formigas em geral têm um papel importante na natureza que vai desde descompactar o solo a combater outros insetos nocivos à cultura vegetal, como gafanhotos, centopeias, aranhas e etc.. E nem toda formiga ataca as oliveiras. As principais “agressoras” são as Saúvas (gênero Atta) e as Quenquéns (gênero Acromyrmex). São 10 espécies de Saúva e 29 de Quenquéns, dentre as 2.000 espécies contabilizadas no Brasil. Em todo mundo são mais de 18.000 espécies.
A Saúva e Quenquén, muitas vezes confundidas, são conhecidas normalmente apenas como cortadeiras. Logo é importante saber identificá-las para que não haja consumo de recursos desnecessários que prejudicam o solo e eliminam outros organismos benéficos ao mesmo.
Um dos grandes problemas das culturas extensivas é justamente combater de forma indiscriminada todo organismo “indesejados”, animais e vegetais, na região da plantação. Isso facilita o aparecimento de elementos “inesperados” que leva ao aumento da especialização dos agrotóxicos e criação de espécies vegetais com gens modificados e patenteados…
Identificando
Saúvas – Características
As mais encontradas no Brasil são: Atta capiguara (saúva parda), Atta sexdens (saúva limão), Atta bisphaerica (saúva mata-pasto), Atta laevigata (saúva cabeça de vidro), Atta robusta (saúva preta), Atta silvai e Atta vollenweideri.
As saúvas apresentam três pares de espinhos e as quenquéns quatro pares. Cabeças grandes, cor avermelhada. As operárias possuem cabeça brilhante. As operárias da saúva são polimórficas e são divididas em jardineiras, cortadeiras e soldados. Todas são fêmeas estéreis.
As jardineiras são as menores e têm como função triturar pedaços de vegetal e colocá-los à disposição do fungo, logo normalmente não as vemos fora do formigueiro.
As cortadeiras, que possuem tamanho médio, cortam e carregam os vegetais para dentro do formigueiro.
Os soldados são os maiores com a cabeça bastante grande. Cortam as folhas auxiliando as cortadeiras, porém têm como função principal proteger a colônia de inimigos naturais.
A rainha das saúvas é chamada de içá ou tanajura. Ela é muito maior que as operárias e facilmente distinguida do resto da colônia. Apenas uma saúva é mantida em cada formigueiro. Quando esta morre em poucos meses o formigueiro se extingue.
Os machos são menores que as rainhas e são chamados de bitus. Sua cabeça e mandíbulas são distintamente menores do que as da rainha, sendo assim facilmente identificados. Não fazem NADA a vida inteira. Servem apenas para a reprodução durante o vôo de acasalamento. Acasalando ou não, morrem logo depois.
As operárias da saúva alimentam-se basicamente da seiva que as plantas liberam enquanto estão sendo cortadas. Pedaços de material vegetal são levados até o formigueiro onde existe um fungo que as formigas cultivam. As operárias então picam em pequeninos pedaços o material vegetal e o inserem no meio do fungo, que vive deste substrato. Envoltas neste fungo são encontradas as larvas que dele se alimentam.
Quenquén – Características
As mais encontradas no Brasil: Acromyrmex ambiguus (quenquém-preto-brilhante), Acromyrmex aspersus (quenquém-rajada), Acromyrmex coronatus (quenquém-de-árvore), Acromyrmex crassispinus (quenquém-de-cisco), Acromyrmex diasi, Acromyrmex disciger (quenquém-mirim e formiga-carregadeira), Acromyrmex heyeri (Formiga-de-monte-vermelha), Acromyrmex hispidus fallax (Formiga-mineira), Acromyrmex hispidus formosus, Acromyrmex hystrix (quenquém-de-cisco-da-Amazônia), Acromyrmex landolti balzani (Boca-de-cisco, formiga rapa-rapa, formiga-rapa e formiga meia-lua), Acromyrmex landolti fracticornis , Acromyrmex landolti landolti, Acromyrmex laticeps laticeps (Formiga-mineira e formiga-mineira-vermelha), Acromyrmex laticeps migrosetosus (quenquém-campeira), Acromyrmex lobicornis (quenquém-de-monte-preta), Acromyrmex lundi carli , Acromyrmex lundi lundi (Formiga-mineira-preta, quenquém-mineira e quenquém mineira-preta), Acromyrmex lundi pubescens , Acromyrmex muticinodus (Formiga-mineira), Acromyrmex niger, Acromyrmex nobilis, Acromyrmex octospinosus (Carieira e quenquém-mineira-da-Amazônia), Acromyrmex rugosus rochai (Formiga-quiçaçá), Acromyrmex rugosus rugosus (Saúva, formiga-lavradeira e formiga-mulatinha), Acromyrmex striatus (Formiga-de-rodeio e formiga-de-eira), Acromyrmex subterraneus bruneus (quenquém-de-cisco-graúda), Acromyrmex subterraneus molestans (quenquém-caiapó-capixaba), Acromyrmex subterraneus subterraneus (Caiapó).
As cortadeiras desta espécie são as operárias. No fomigueiro, destino do material cortado e transportado, as operárias picam todo material trazido em pedaços bem pequenos onde fungos crescerão.
As quenquéns possuem quatro pares de espinhos e as saúvas três, além disso possuem a cabeça um pouco alongada.
As operárias da quenquém podem variar bastante de tamanho (de 2,0 a 10,5 mm), bem como de coloração em um mesmo formigueiro.
As rainhas e machos das quenquéns não têm diferenciação e tem como função exclusiva a reprodução da colônia.
Combate
Talvez essa seja a pior inimiga das mudas das oliveiras até os 2-3 anos de idade. As folhas devem ser muito gostosas… Bem o chá e muito bom!!!. Além das soluções químicas fartamente oferecidas no mercado, encontramos alguns “terroristas ecológicos” que sugerem óleo queimado ou querosene nos formigueiros. Não precisa, e o resultado a curtíssimo prazo não paga os prejuízos a médio e longo prazo. Os venenos e hidro carbonetos contaminam a terra por anos, dezenas de anos, além de poderem contaminar lençóis freáticos e os frutos. Mesmo aplicando esses produtos longe da muda, o sistema radicular vai buscar longe os nutrientes (e venenos). No caso das oliveiras pode chegar a espantosos 20 metros em uma árvore antiga.
Damos algumas sugestões, sem uso de agrotóxico – veneno:
– Chumaço de algodão no caule da muda: Tentamos mais não observamos o resultado esperado que eram formigas presas no chumaço. Além disso, quando o algodão molha ele fica compactado facilitando o desfile das formigas em direção as folhas, ou seja: Método reprovado! Citamos apenas por curiosidade caso alguém ouse citar como um bom método.
– Destruição mecânica dos olhos dos formigueiros: Trata-se de um jeito de diminuir a vitalidade de um formigueiro que pode criar dezenas de saídas a superfície. Cavar +/- 50 cm, revolver a terra e depois “compactar”. Não acaba com as formigas, mas atrasa o desenvolvimento do formigueiro e mitiga o estrago que ele pode causar.
– Criar barreiras de vinagre e álcool em torno das mudas: Não é muito eficaz, pois o volume de vinagre acaba sendo alto devido as reaplicações constantes.
– Fungo da laranja: A alimentação do formigueiro não é o que as cortadeiras transportam para o formigueiro, e sim o material decomposto por fungos (Lepiotaceae, Basidiomycota) cultivados por elas. Não serve qualquer fungo. A laranja ao apodrecer produz um fungo que se desenvolve no mesmo ambiente que as “fazendas” das formigas, mas mais rápido. As formigas não se alimentam desse fungo, logo haverá escassez de alimentos e extinção do formigueiro, contudo é mais provável que o transfiram para outro local. Ganha-se tempo e redução das cortadeiras. É uma tentativa, pois alguns formigueiros combatem os fungos concorrentes. O grau de especialização da sociedade é tão elevado que dentre as saúvas existem as “lixeiras” que removem para camaras específicas fungos mortos e outros produtos que são subprodutos da colônia. Ficam os revolvendo a fim de acelerar a decomposição. Farão isso a vida inteira.
A aplicação é simples. Deixe uma quantidade proporcional de laranjas a quantidade de fungo que se quer obter apodrecer até ficarem tomadas de fungo. Esse fungo é inofensivo para os seres humanos e pode até ser manipulado sem luva. Raspe o fungo em uma embalagem e imediatamente comece a distribuir pequenas quantidades nas entradas dos formigueiros, ou ainda onde você sabe que as formigas passaram e arrastaram para dentro do formigueiro o fungo da laranja. E só isso. Demora alguns dias para o formigueiro começar a entrar em colapso, mas vai acontecer.
Uma dica que vem do Luiz do azeite Rossini:
“Qto a formigas, saúva e a quem-quem, experimentem essa forma de combate. Ao plantar a muda, coloquem uma garrafa pet ( so a parte central da mesma). Fiz isso em umas 1000 oliveiras. Garrafa pet de 2 litros ou 2 litros e meio, de preferencia lisa (fanta, guarana e etc) cortem o fundo (uns dois dedos) e o pescoço (uns 3 a 4 dedos). Depois enterrem uns dois /três centímetros em torno da muda. Cuidado a ser tomado, quando chover limpar as garrafas, pois como espirra terra, serve de “escada” para as formigas.”
Muito obrigado Luiz pela sua participação! Ficamos no aguardo de mais sugestões.
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